quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Metamorfose

Eu era a lagarta frágil e tímida que se demorava nos veios frescos da folha.
Roliça e redundante no universo verde daquela floresta.
Guiada pelo instinto seguia o percurso cintilante das gotas de orvalho até ao inevitável abismo do vértice vegetal.
No fim do caminho a gigantesca disputa, os meus pequenos olhos esbugalhados perante a atmosfera infinita.
Iniciei o árduo trabalho de me enrolar em seda. Rodopiei até à exaustão numa dança fervorosa e geneticamente determinada.
No fim eu era apenas um corpo amorfo e imóvel à espera que os dias passassem. Nem morta, nem viva, no limbo da existência, esqueci quem era e transformei-me em algo diferente.

Borboleta!

sábado, 10 de dezembro de 2011

Sol de Inverno

É quase Inverno mas o sol brilha.
Hoje, como tantas outras vezes, o tempo assemelha-se ao meu estado de espírito.

Estou desiludida e nostálgica. O fluxo de sentimentos interrompido, a alma gelada como o clima lá fora. Mas, na ressaca da grande decisão, estou aliviada. Um peso enorme que desapareceu e um holofote de raios de sol que agora me ilumina amenizam o chão coberto de neve e as estalactites de gelo que pendem dos vértices do meu corpo.

Não me parece que houvesse Amor naquilo que eu era até ontem, entre a espada e a parede, humilhada e traída mas, ainda assim, a tentar encontrar uma migalha que salvasse a relação.
No início havia um bolo grande e cheio de afecto. Havia. Depois alguém o devorou sem remorsos deixando apenas estas migalhinhas milimétricas que eu, estupidamente, lambi do chão sujo.

Pelo menos agora, que não resta nada, não há desculpa para não começar de novo.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

O fim do dilema

O fim do dilema é profundamente doloroso e estranhamente libertador.
Anos passados a hastear bandeiras de valores, confiança e respeito não podem ser em vão.

O contexto não justifica tudo. Reside em nós a derradeira decisão. Agarrar-me-ei a esta convicção até que as forças me falhem e o tempo me consuma a sanidade.

A vida continua.

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Dilema

Hoje faço uma pergunta.
É para vocês porque as minhas possibilidades de resposta já se esgotaram, consumiram os meus sorrisos, transformaram aquilo que podia ser bom numa constante tortura.

O que fazer quando amamos alguém cujo passado nos perturba?
Ainda que o tempo tenha passado e tudo o que aconteceu de condenável esteja longínquo. Ainda que não fizéssemos parte das histórias quando elas aconteceram. Ainda que a expressão dele se assombre quando se mencionam os factos decorridos.
Já tentei esquecer mas não consigo. Vislumbro tudo como se acontecesse diante dos meus olhos. Quero acreditar na pessoa que tenho ao meu lado mas há sempre uma sombra, um passado que apaga os contornos da minha confiança e que ameaça projectar-se no futuro. Mas uma sombra sem lógica, sem fundamento.

O que fazer para viver plenamente no presente e esquecer o que deveria estar morto e enterrado?

domingo, 24 de julho de 2011

Responsability

Não venha o tempo dizer-me que eu sou louca, já eu conjecturei esse cenário, dada a quantidade de vezes que olho em volta e me encontro diferente do resto do mundo.

Conversamos e todos se riem das imoralidades do quotidiano, é banal por isso perdoa-se, todos fazem por isso não há problema, desde que não seja o próprio a ostentar a coroa de totó eis que faz sentido gargalhar aqui com a malta... Toda a gente sabe que estas coisas desagradáveis só acontecem aos pacóvios, porque quem se ri assim, de escárnio e puro gozo, tem uma inteligência que se eleva a tudo isto.

Mas eu não. Não me vou perdoar pelas coisas menos éticas que fiz, pelas vezes que ignorei que era responsável por aqueles que cativava, que apontei uma lupa ao umbigo e me concentrei nessa visão distorcida. E não me rirei deles, das lágrimas que choraram e das noites em que não dormiram.

Já dizia o outro que um grande poder traz uma grande responsabilidade e isso nunca é mais verdade do que nos relacionamentos. O sentido de responsabilidade não é uma obrigação exclusiva de super-heróis e primeiros-ministros.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Fantasmas

Eu tenho os meus próprios fantasmas, não preciso dos teus.

Tenho os meus debaixo da cama, amestrados, sedados, enrolados em papel escuro, contraídos sobre si próprios num equilíbrio que demorou anos a atingir.
Os teus, não os conheço bem. Parecem-me, a esta distância, assustadores, tentáculos que te abraçam todos os dias num afecto doentio e doloroso que alimentaste ao longo do tempo, no masoquismo lamentável de quem não tem coragem para dar o passo em frente.

Não mos entregues agora, não partilho almas penadas.
Basta-me já a dor de os ver reflectidos nos teus olhos, a sensação de os ter comigo como uma pedra no sapato da qual não me posso desfazer.

E o pior de tudo é vê-los aumentar quando falamos neles e por isso ter de fingir que não existem, que não passeiam na penumbra do quarto, que não sobrevoam o nosso abraço, que não conspurcam os nossos sonhos, que não comprometem o nosso futuro.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Acorda e acorda-me!

Encho-me de tédio de mim mesma.
Doem-me os olhos de me ver e rever ao espelho.
Mesmo quando a escuridão me rodeia e adormeço, sinto-me na prisão do meu corpo, convulsões tempestuosas para sair da gaiola humana.

O teu toque já não é suficiente para me despertar do cárcere e por isso desinquieto-me. Apetece-me apertar as tuas mãos com força quase bruta para que percebas que preciso de mais, preciso de me fundir contigo, de sair de mim, de ver o meu reflexo nos teus olhos e não na estática e descorada superfície do espelho.

Acorda e acorda-me!

Tenho medo que a tua alma fique para sempre assim, baça, que as nossas mãos se desenlacem e fiquem inertes, apenas mais uma parte de um corpo triste e amorfo.

Tenho medo de acordar e querer ir embora.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

As histórias de amor são ridículas

Passa o tempo e passam as pessoas.

O blog fica, persiste, imutável na sua essência.
Será para sempre o local onde tudo pode ser escrito, relatado, chorado e exorcizado.
Será para sempre um local imune à censura, redoma da minha espontaneidade literária, abrigo do qual jamais abdicarei.

Se me dispo de todos os mecanismo de defesa e me revelo na minha fragilidade gritante então que assim seja, se se cansa quem lê do tom obscuro e melancólico então que pare de ler, que adormeça, que se esqueça do meu nome e de tudo o resto que o embaraça.

Porque todas as histórias de amor são ridículas.