segunda-feira, 8 de março de 2010

Isto

Escrever para quem não pode ouvir.
Juntar as palavras apenas desejando que façam sentido.
Mesmo que quem escreve não saiba que sentido devem ter.

O fundo é de cinzas e o nome de vermelho-sangue, a julgar pelos comentários é um blog deserto e inóspito, onde se movem olhos invisíveis e respostas nunca redigidas.

Se este é o outro deve haver um primeiro, se calhar o primeiro era a floresta que ardeu, o verde que esmoreceu, a esperança que se perdeu...

sexta-feira, 5 de março de 2010

Prólogo

Quando o despertador tocou e passei do sono para o torpor matinal ainda não havia claridade lá fora.
Já não me lembro se me espreguicei ou se apenas pensei em fazê-lo.
Alcancei a mesa de cabeceira com um gesto cego da mão e agarrei com força o telemóvel. Deixei-me transportar no tempo para as horas tardias e as coisas escritas. Talvez tenha esboçado um sorriso triste.
Levantei-me lentamente e deslizei para fora do quarto.
A água quente no corpo semi-adormecido teve um efeito calmante, deixei que me envolvesse completamente e desejei com força que as minhas angústias se evaporassem com a água tépida.
Mais uma vez a chuva aguardava-me lá fora, rítmica e inevitável, indiferente aos percalços e desventuras dos simples mortais.
Vesti-me.
O cabelo, hoje mais ondulado do que o habitual, apoiou-se docemente sobre os meus ombros estreitos e enquadrou um rosto estranhamente inexpressivo.
Fecho a porta atrás de mim e percorro automaticamente o caminho até à paragem do autocarro.
É cedo. A cidade ainda não acordou mas pequenos ruídos e movimentações denunciam um vulcão adormecido que, tal como eu, está prestes a entrar em erupção.

quinta-feira, 4 de março de 2010

Guerra Civil

Coisas que digo.
Coisas que não digo.
Coisas que devia ter dito.
Coisas que devia ter feito.

Sonhei com o Nepal e com terroristas armados.
Não sei porquê.
Deve ser porque estou em guerra civil.

quarta-feira, 3 de março de 2010

De pernas para o ar

Acordei e senti-me diferente, uma ansiedade profunda e inquietante.
Um sentimento que me pareceu familiar mas há muito esquecido começou a ocupar-me, de mansinho mas de forma irreparável, e de repente foi como ver o mundo através uma lente desfocada, deturpada, irreal. Tudo se passava agora na minha cabeça, no meu coração, um turbilhão de coisas, a chuva lá fora não é nada, o vento frio, as vozes, os empurrões, não me tocavam sequer num milímetro de consciência. Estava tudo cá dentro a pedir-me a misericórdia de sair, de explodir, e eu a dizer que não, impiedosamente, dolorosamente...
E os meus dedos tremem enquanto escrevo, o meu estômago vazio não exprime mais do que um formigueiro... Dizem que é mesmo assim não é? E fiquei encharcada dos pés à cabeça, as mãos geladas, os pés gelados, tudo lá fora gelado e cá dentro tudo de pernas para o ar.

terça-feira, 2 de março de 2010

Rede

... E se eu estiver perdida numa encruzilhada,
Ao mesmo tempo de costas e de frente para tudo o que sempre quis,
... E se eu sequer sonhar que arriscar vale a pena,
Quem estará lá no fim para me segurar?